Angra e suas lendas: Da água Mágica a Histórias Surrealistas

Bica da carioca em Angra dos Reis com o ano de construção 1842 gravado

No século XIX, em Angra dos Reis, apesar do progresso, a água era vendida de casa em casa, armazenada em barris. Uma das nascentes estava localizada no alto da chácara da Carioca, onde a água era coletada em canos de bambu e jorrava em um poço na parte mais baixa. Em 1842, a Câmara Municipal construiu um chafariz no local para que a população pudesse abastecer-se de água.

O chafariz da Carioca: da água mágica ao namoro proibido

No entorno dessa fonte, criaram-se várias histórias e lendas. Uma delas dizia que as pessoas frequentemente iam à fonte da Carioca durante as tardes para passear e beber água fresca e límpida que jorrava das cinco bicas. Segundo a lenda, quem bebesse água da bica do meio jamais esqueceria Angra e, caso saísse da cidade, um dia voltaria.

O amor proibido ao pé da fonte

Tanto os rapazes quanto as sinhazinhas, acompanhadas de suas mucamas, também apreciavam esse passeio. Trocas de olhares, sorrisos e cumprimentos eram comuns, e ocasionalmente ocorriam breves conversas. Esse cenário encantador, com o frescor ao pé da fonte, o aroma das acácias, das flores das paineiras e das flores silvestres ao redor, tornava o local paradisíaco.

Entre os jovens da época, também havia o hábito de apreciar esse passeio romântico. Os olhares eram trocados, sorrisos furtivos eram compartilhados. Certa vez, um rapaz mais ousado se aproximou de uma mucama e, como se pedisse para beber água, entregou-lhe um bilhete repleto de frases lindas, juras de amor e pedido de permissão para se aproximar da jovem escolhida. Seu pedido foi concedido. Embora os encontros ao pé da fonte fossem raros, eles foram suficientes para que eles compreendessem que estavam apaixonados. No entanto, ao descobrir esses encontros, o pai da jovem proibiu o passeio.

O triste destino dos amantes

Mesmo após a proibição, o rapaz apaixonado continuou a ir à fonte todos os dias, esperando rever a musa dos seus sonhos. No entanto, em vão. Triste e abatido, ele se juntou aos Voluntários para a Guerra do Paraguai. Antes de partir, enviou-lhe uma mensagem: ainda esperava encontrá-la um dia, mesmo que fosse depois de morto.

A moça definhou dia após dia, lamentando o amor perdido. O rapaz morreu nos campos de batalha, e a jovem passou seus últimos dias em seu leito de dor. Segundo os antigos, em noites de lua cheia, é possível ver duas sombras de mãos dadas junto à fonte, envolvidas pela luz que se infiltra e se espalha entre as folhas das paineiras.

A maldição de Jorge Grego

A história de Jorge Grego, navegante que se dirigia ao Estreito de Magalhães, é outra lenda da região.

Perseguido por navios da Armada Inglesa, Jorge grego se viu sem alternativa a não ser ancorar próximo à terra mais próxima para salvar suas duas filhas e um marinheiro que mais tarde ele próprio escravizou.

Com o passar do tempo, as filhas cresceram, a pirataria foi esquecida e uma próspera agricultura floresceu por toda a ilha. No entanto, Jorge grego percebeu a paixão de seu escravo por uma de suas filhas, o que o levou ao desespero.

O pirata assassinou seu companheiro e se tornou amante de suas próprias filhas, até que uma maldição se abateu sobre a ilha. Ventos nunca antes vistos varreram repentinamente as casas, as lavouras, suas filhas desapareceram e os campos secaram.

Sozinho e louco Jorge Grego, vagou pela ilha até a morte, enterrando antes todo o tesouro que acumulou, até hoje muitas pessoas acreditam que o tesouro ainda continua enterrado na ilha que leva o seu nome.

A padroeira de Angra e as tempestades

Essa lenda está relacionada à mudança do padroeiro da cidade, originalmente fundada sob a invocação dos Reis Magos.

Em 1632, um navio procurou abrigo na enseada durante uma grande tempestade. Como que por encanto, assim que a embarcação atracou no porto, os ventos se acalmaram e a tempestade cessou.

O comandante então desembarcou para reparar os danos em seu navio e informou que estava levando uma imagem da Senhora da Conceição, em tamanho natural, para a Capitania de São Vicente, que pertencia à Vila de Itanhaém.

Os moradores de Angra demonstraram o desejo de contemplar a imagem, mas o comandante negou o pedido, alegando que ela estava muito bem guardada. No entanto, logo após o navio partir novamente, outra violenta tempestade interrompeu a viagem.

De joelhos, o comandante e os marinheiros fizeram promessas à virgem para que conseguissem retornar à baía em segurança, o que de fato ocorreu. Uma das promessas era desembarcar a imagem e permitir que os moradores de Angra a venerassem.

Mais tarde, descobriu-se que, na enseada, o mar nem sequer estava agitado, o que parecia ser uma prova do desejo de nossa senhora de permanecer em Angra. Os moradores então, através de doações compraram a imagem para que ela permanece na cidade, como está atualmente no altar da igreja matriz de Angra dos Reis.

O assassinato do frade

Outra lenda da região é a do piedoso frade, que percorreu as áreas de Angra catequizando os índios antes da colonização portuguesa. Em uma dessas missões, ele foi brutalmente assassinado pelos próprios índios, o que deu nome a uma das montanhas mais pitorescas da região: O pico do frade, com 1.640 metros de altitude, localizado às margens da Rodovia Rio-Santos, onde atualmente se encontra o condomínio do frade.

Árvore do nascimento

Uma tradição local conta que, sempre que um menino nascia na Ilha Grande, seu pai plantava uma árvore específica, que crescia rapidamente e era adequada para a construção de canoas. Quando o filho entrava na adolescência, seu pai lhe entregava um machado e lhe ensinava a arte de serrar e entalhar sua própria canoa. A partir desse momento, o filho era considerado apto para trabalhar na pesca.

Enriquecendo o imaginário popular da cidade

As lendas e histórias de Angra dos Reis trazem consigo elementos misteriosos, românticos e históricos, enriquecendo o imaginário popular da região. O Chafariz da Carioca, Jorge Grego, a Padroeira de Angra, o Frade e a tradição da Árvore do Nascimento são apenas algumas das narrativas que permeiam a cultura local. Essas lendas são uma parte importante do patrimônio cultural da região, preservando tradições, crenças e memórias que são transmitidas ao longo das gerações. Ao conhecer essas histórias, os moradores e visitantes de Angra dos Reis podem mergulhar na rica e fascinante história dessa bela cidade.

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